sábado, 18 de junho de 2016

VT CÂNON - Introdução Geral

   
O termo "cânon" é derivado de palavra grega, que significa "pedaço de madeira comprido, régua de carpinteiro, regra, tipo, molde, princípio". No que se refere à literatura bíblica, cânon indica aquelas obras escritas que se conformam com a regra ou padrão da inspiração e autoridade divina.
Embora o termo "Cânon" não tenha sido aplicado aos livros do Velho Testamento até o quarto século A.C., o conceito de canonicidade era muito mais antigo.
"É dito que um livro é de autoridade canônica quando tem o direito de tomar um lugar com os outros livros que contêm uma revelação Divina. Tal direito não surge de qualquer autoridade eclesiástica, mas da evidência da autoria inspirada do livro. Os canônicos (inspirados) livros do Velho e Novo Testamentos, é uma regra completa, e a única regra de fé e prática. Eles contêm a revelação sobrenatural inteira de Deus para os homens." (DICIONÁRIO DA BÌBLIA DE EASTON, verbete Cânon).
O Dr. Young faz uma defesa extremamente conservadora sobre a questão da canonicidade dos livros bíblicos vinculando-os à questão da inspiração, de maneira que, segundo ele uma vez que o livro tenha sido inspirado, torna-se canônico, sendo aceito ou não pela maioria ou minoria de pessoas, pois somente Deus pode atestar se um livro é ou não é canônico, ou seja, se deve ou não ser incluído no conjunto das Escrituras Sagradas.
Ainda segundo o Dr. Young, a razão pela qual se cria tantas e calorosas discussões sobre o cânon bíblico é pelo fato de que se parte do pressuposto de que tais livros é meramente uma lista de livros que um grupo judaico classificou como divinos, menosprezando totalmente o aspecto teológico da questão. E conclui ele sua argumentação:
Para o crente Cristão, todavia, a palavra ‘cânon' se reveste de um sentido muito mais elevado; ... reconhece que as Escrituras são inspiradas porque elas são, e trazem em si mesmas as evidências de sua origem Divina. ... Por conseguinte, os homens reconhecem a Palavra de Deus simplesmente porque o próprio Deus lhes afirma qual seja a Sua Palavra. Deus lhes dirigiu a Sua verdade e a identificou para os homens. Portanto, é de grande importância, para a correta, compreensão do problema inteiro, a doutrina do testemunho interno do Espírito Santo. ... o crente possui a convicção que as Escrituras são Palavra de Deus, e que essa convicção foi implantada na mente do crente pela Terceira Pessoa da Trindade. Essa convicção tem sido possessão do povo de Deus desde que a primeira porção da palavra de Deus foi posta em forma escrita. Não pode haver dúvidas que o verdadeiro Israel reconheceu imediatamente a revelação de Deus. (YOUNG, 1964, pp.37-38).
Entretanto, dentro de um processo seletivo para se diferenciar um escrito inspirado de outro não inspirado, ainda que a própria Bíblia não forneça qualquer conjunto de critérios específicos, alguns foram estabelecidos e observados:
a) Autoria Profética - um livro canônico deve ter sido escrito por um profeta (VT) ou apóstolo (NT) ou por alguém que teve um relacionamento especial e direto com eles (Marcos-Pedro; Lucas-Paulo). Somente os que tinham testemunhado eventos ou tinham registrado testemunho de testemunhas oculares podia ter seus escritos considerados como Escritura Sagrada.
b) Testemunho do Espírito - o testemunho interior do Espírito Santo é critério indispensável neste processo seletivo, uma vez que Ele intervém diretamente em todo o processo histórico da vida destes escritores bíblicos.
c) Aceitação - o critério final neste processo de canonização era a aceitação por parte dos crentes do VT e do NT de que estes escritos eram parte integrante do ensino de Deus para a vida de seu povo.
A ideia de um Cânon está na fundamentação teológica da fé cristã. Sem estas palavras disponíveis não haveria nenhum exercício do Senhorio de Deus sobre nós, como povo dele, e não haveria nenhuma promessa segura de Deus de que enviaria um Salvador.
É certo que Deus teve suficiente razões para estabelecer um Cânon do Primeiro Testamento às pessoas que viveram antes da Vinda do Senhor Jesus Cristo. Abaixo mencionamos algumas destas razões:
- Aqueles primeiros crentes puderam Ter uma revelação completa de Deus em seu próprio tempo. Isto foi fundamental para que eles tomassem conhecimento do Evangelho antes do tempo da Cruz e que compreendessem o plano Redentor e Gracioso de Deus.
- Aqueles crentes puderam ter a Palavra Escrita de Deus para viver por ela.
- Esta Palavra Escrita pode ser preservada através dos séculos.
Assim, um Cânon pode ser estabelecido e claramente diferenciado de outros escritos que surgiram e que não possuíam o selo da inspiração divina.
O conteúdo do Cânon Protestante é equivalente ao conteúdo do Tanak, que é um acrônimo para as três partes do Cânon Judaico, ("T" para Torá, "lei/instrução"; "N" para Neviim, "os profetas"; e "K" para kethubim, "os escritos"). O Cânon Católico Romano está baseado na Septuaginta ou Versão dos Setenta (LXX)[1] e na tradução da Vulgata Latina,[2] agregando mais quatorze livros, que eles classificam como Deutero-canônico (segundo cânon), mas que os Protestantes denominam de Apócrifos (literalmente - livros escondidos).[3] Portanto, em relação à Bíblia Hebraica, os judeus aceitavam como canônicos apenas vinte e quatro livros, e que na versão protestante tornam-se trinta e nove, conforme a tabela em (http://reflexaoipg.blogspot.com.br/search/label/VT%20-%20C%C3%A2non CANON-AT-Tabelas-dos-Principais-Canon/), porque a disposição ou organização destes livros, neste caso, segue a Septuaginta.
Diante destes fatos: Qual cânon deveríamos utilizar? O debate nunca cessará. Mas um interessante argumento, mas não infalível, é fundamentado em Mateus 23:35. Em um debate com os Fariseus, Jesus disse que eles eram responsáveis pelas mortes de todos os profetas, desde Abel (Gen. 4) até Zacarias, filho do sacerdote Joiada (2 Cron. 24:20). Estava Jesus pensando cronologicamente? Não, pois Urias, o profeta, foi morto depois do tempo de Zacarias (conforme Jer. 26:23). Jesus estava pensando canonicamente? Possivelmente, pois Abel foi o primeiro mártir na Bíblia e Zacarias foi o último profeta a ser martirizado, conforme registrado em 2 Crônicas - que é frequentemente o último livro na Bíblia Hebraica. Assim sendo, Jesus utiliza o cânon mais curto, hebreu, e não o cânon mais longo, grego, onde 2 Crônicas é colocado antes do livro de Jeremias.

Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
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Historiologia Protestante

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AT – Salmos
AT – Profetas
AT – Pentateuco
AT – Síntese Bíblica


Referências Bibliográficas
YOUNG, Edward J. Introdução ao Antigo Testamento. Vida Nova, São Paulo, 1964.



[1] Com a conquista do mundo por Alexandre o Grande (330 a.C.) o grego passou a ser uma língua internacional. Os judeus dispersos desde os dias do exílio Babilônico e que não voltaram com Esdras e Neemias, concentraram-se em Alexandria, alcançando aproximadamente um milhão e meio de pessoas. Com o passar dos anos eles perderam contato com a sua língua pátria o hebraico. Para que não ficassem impossibilitados de lerem as Escrituras eles começaram, por volta do ano 250 a.C., uma tradução para o grego. Iniciaram pelo Pentateuco e com os anos foram traduzindo todos os demais livros do Velho Testamento. Esta versão grega tornou-se rapidamente popular entre os judeus dispersos e até mesmo utilizados por judeus na Palestina. Os tradutores da Septuaginta fizeram uma nova classificação dos livros do Antigo Testamento, usando o critério dos assuntos centrais de cada livro. Os tradutores para o Português acompanharam a ordem da Septuaginta, como se vê em nossas Bíblias atuais.
[2] Quando o latim se tornou a língua popular, Jerônimo traduziu o Tanak para o latim em aproximadamente 400 d.C. Porque o latim era o idioma comum das pessoas, está tradução foi chamada de Vulgata ("meios vulgares; comum"). A Vulgata, porquanto manteve os livros apócrifos, se tornou a base para a Bíblia católica de hoje.
[3] Isto ocorreu no Concílio de Trento realizado em 1546, até então estes livros ainda que fossem inseridos no conjunto dos livros canônicos, nunca haviam sido considerados como inspirados e consequentemente como fonte inerrante para fundamentação teológica ou doutrinária. Eram aceitos apenas como livros que traziam informações de um período histórico entre o Velho e o Novo Testamento, onde Deus não havia se manifestado de forma profética em Israel, o chamado "400 anos de silêncio". A palavra ‘apócrifo' deriva do grego, que a princípio significava algo oculto, secreto ou escondido, mas com o passar do tempo, passou a ter sentido de heresia ou de autenticidade duvidosa. A maioria dos livros apócrifos foram escritos por volta de 200 a.C. até 350 d.C., nos mais diversos locais: Palestina, Síria, Arábia, Egito. Em contraste com os livros canônicos, os apócrifos não eram lidos nas sinagogas e depois nas igrejas, pois a grande maioria apresentavam ensinamentos heréticos e doutrinas falsas; tinham a finalidade de defender ideias de certos grupos isolados como os gnósticos, os docetas e os judaizantes. Quando a Igreja resolve definir o cânon das Sagradas Escrituras, a partir do séc. IV, pouco a pouco os apócrifos vão caindo no esquecimento até que a Igreja Católica Roma incorporou alguns deles e os autenticou.

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